domingo, 25 de dezembro de 2011

Catarse

17 anos. Só vestia azul. Sempre perfumada e ignorando os 'machos' de plantão.
Adorava cinema nacional - afronta num Brasil que se diz Brazil.
Lá pela 7ª vez que assistia 'Amarelo Manga', como boa admiradora de Cláudio Assis, repensou os roteiros de sua vida (talvez seja o exato momento em que ocorre a transição criança/adulto, o momento que passamos de fantasiosos para tristes e sozinhos) e procurou uma cartomante.
Será possível? A velha não faz o buço! Já lhe corria milhares de imagens do corpo da velha, pra buço assim, imagina o resto.
Pois bem, pouco importa, desde que diga coisas boas...
Carta vai, carta vem - amor novo, dinheiro...
Saiu. Feliz por iludir-se com as palavras que por alguns instantes confortaram!Três giros e acertou em cheio.
- Tão nova, foi o táxi! Nem ambulância, direto IML.

'Casa - Quarto' - Entrou

Seis da tarde. Já cansada foi despedindo das amigas e cega foi para casa.
Casa - Entrou. Tão como costume, não reparou o cara ali no sofá...
Quarto - Entrou. Tirou a roupa. Ele vendo pelo reflexo da TV, esperou a moça adiantar serviço. Entrou quando já nua - Um berro.
Ele riu, meteu-lhe um murro 'nas fuças' e fez de tudo.
Pobre moça, virgem para o noivo. O noivo? Nos fundos, pensava alto enquanto furava a fossa.

quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

Infância

A infância é feita de cheiros.
O cheiro de bolor nas paredes, os cheiros diferentes dos jardins, o cheiro de alho que paira no ar nas novenas junto com o coro das velhas beatas.
Cheiro de riso, riso proibido, riso sem motivo, riso do riso.
Não precisa muito pra voltar à infância, talvez um reencontro com um velho amigo, aquela amizade que já enferrujada aflora no simples - riso. Riso com cheiro de que seremos amigos para sempre. Riso de que seremos crianças para sempre.
Não precisa muito pra voltar à infância, um pisar na grama orvalhada, o cheiro de mate, cheiro de mato!

"Amei em cheio/meio amei-o/ meio não amei-o". Velho Leminski, ainda vivo.
O gostinho da bolacha Maria com geleia de uva como disse o Vampiro de Curitiba...
Como descrever? Talvez pelo cheiro.

Companhia para o Valduero

Arrastou-a até a cozinha, um beijo em cada mão e outro na testa. Abriu o Valduero, bela safra. Ofereceu uma taça, sem resposta deduziu que quem cala consente. Abriu sua pequena boca, despejou.
Já perto do jantar – cortou a carne em tiras, colocou em um vasilhame, cobriu por água e se pôs sentado a picar alho, cebola, tomates e cheiro-verde.
Escorreu a água reservando-a. Na panela juntou a carne e refogou até soltar bem. Jogou alho, cebola, tomates e o cheiro-verde. Generoso foi com o sal e a pimenta.
Abaixou o fogo, tampou a panela e entre goles do Valduero mexia e molhava com a água reservada. Comeu sozinho, pois a companhia parecia sem vida.
As bochechas localizam-se na face, abaixo dos olhos, entre o nariz e a orelha (esquerda ou direita), tão belas refogadas quanto no rosto.

domingo, 18 de dezembro de 2011

Miopia

Terceira cerveja. Já não sei se é porque preciso aumentar o grau dos óculos. Três ou quatro cigarros para dar um tempo na cerveja. Estou de carro. Já pensou?
A menina voltou para perguntar se não queria mais uma...
Engraçado, o avental é o mesmo, mas a moça parece diferente. Será que faz tanto tempo e já deu pra trocarem de turno? Não, acho que ela soltou o cabelo.
Já reparou que quando prendem o cabelo tem muito bêbado pra atender? Não sobra tempo... Abrir garrafa, buscar garrafa, tapa na bunda, desaforo...
O tempo para arrumar o cabelo resume-se em predê-lo.
Dois meninos me dão tchau da mala de um carro - corrigi miopia.

sábado, 17 de dezembro de 2011

Ismos

tão                                      compacto
         tão                  com pressa
                  pressa
                  pacto
                  prece
                  presa

Quid pro quo

Prefiro não ser
mesmo gostando ser.
Uma anarquia calculada.
Leminski está vivo?
Não fazer apenas
                                                          por não fazer!
Escrever por escrever.

quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

Ele/Ela

Ele - Curitibóca, segundo ano de Medicina! Chupim de vaga em Ponta Grossa. Sempre com um saquinho de alguma porcaria para não deixar a boca vazia. Ex-fumante - Parou pela faculdade. Já viu? Médico fumando? Mas tinha uma vontade...
Ela - Terceiro ano de cursinho. 1º lugar nos simulados/concursos de redação, mas na hora do vestibular... Vai saber. Desistiu! Não sai de casa, fez vestibular por fazer - Passou! 
Ele/Ela - Conheceram-se no trote. Trote - bar - pra casa ou pro sexo? casa ou SEXO? casa ou SEEEEEEEEXO?
Engravidou, largou a faculdade. 
Ele - Médico
Ela - ...

terça-feira, 13 de dezembro de 2011

Sborra

Faltam três. Os gritos ecoaram pelas voltas da escada.
- Nino! Anda que teu pai já está voltando. Sborra, Essere figlio di papà.
Bernardino, 15 anos, quieto. Desde pequeno quieto.
Ficou com três unhas sem cortar. Cresceu, enforcou a mãe e o pai, sentou e cortou as unhas (todas).

sábado, 3 de dezembro de 2011

Senescência

São 3 anos sozinha! Parada, percebe que não mais a olham, apenas veem. As somáticas morrem e não são substituídas, o rosto não faz questão de permanecer sorrindo, a senescência é rápida e entra sem bater. Parada, é somente uma ameaça ao previdenciário...

terça-feira, 22 de novembro de 2011

Hortênsias

Desviando dos canteiros azuis bordados de hortênsias, a menina corria para a cozinha escutando os chamados da avó. Parecia sentir o cheiro do chá de Cidreira que acompanhava sempre 5 ou 6 bolachas água e sal...
Entrou e viu a velha - esticada, envolta em sangue que escorria pelos furos provocados por golpes de tesoura.
Serviu-se do chá, das bolachas e das hortênsias açoitadas por golpes de tesoura.

quarta-feira, 16 de novembro de 2011

Quatro cigarros - uma facada.

Duas semanas no litoral. Nós como irmãos, R$3,40 pela carteira de Derby Prata (economias). Quatro cigarros, halls preto e fomos andando até anoitecer. Seis anos passaram, laços estreitaram-se, rumos diferentes e preocupações diferentes! 
Um mulato recostado no poste mirava firme seu rosto, aproximaram-se, um aperto de mão e apenas uma facada no estômago! O mulato sangrou até morrer.

Velho

- Olha aquele velho! Como não morre?
- Velho né?
- Não, fuma e bebe o dia todo.
- Vai saber...
- Nunca deita! Odeio Pincher.

quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Rançosa

Rolei da esquerda à direita. Levantei. Café velho por preguiça, pão dormido com manteiga quase rançosa. O elevador demora 14 segundos do meu andar ao térreo, quase sempre encontro à vizinha (quando ela não atrasa - nunca eu). 
Deixei a caneta cair e esperei ela pegar, entregou-me, disse "por nada" antes do meu "obrigado" e saiu.
Voltei pra casa, rolei da direita à esquerda. Dormi.

sábado, 29 de outubro de 2011

Madrugada

Três tragadas fortes, apertei o filtro por costume e joguei a bituca na "boca de lobo", dez minutos de remorso. Só dez.
Memória de bêbado é curta - levantei, enfiei a mão no bolso e encontrei duas cartelas da Mega-Sena que havia esquecido de jogar. Memória de rato, cáspita!
Lá vem mais um "cara cheia" pedir cigarros e culpar a sogra ou mãe pelo fracasso do casamento! Crises de riso são frequentes, mas aquela altura da bebedeira era hora das lamentações... Segurei o riso por pouco tempo, tantas noites de farras e vida boêmia e aparece tal criatura. Óculos amarelos, calvo, unhas feitas e pretas (não peça mais detalhes, para um "pé inchado" estes são muitos).
Arrastou-me para um velha casa e durante o caminho (monólogo) contou de seu tesão por ouvir da boca de uma mulher o sonoro "CANALHA". Em tempo: Não julgue mal, nada daquele canalha que você acaba de definir inconsciente, sim o adorável canalha. Único e irrepetível - CA NA LHA!
Pois bem, largou minha carcaça dipsomaníaca em frente ao portão e após três escarros ordenou que entrasse.
Encontrei o mesmo homem, porém velho. Muito velho. Olhou para o chão e um estouro oco de sua cabeça ecoou pela casa.
A madrugada some, os delírios somem, os buracos das ruas provocam balanço nos seios do lotação... Conferi os números que não apostei e errei todos.

sábado, 15 de outubro de 2011

Mania

Lembro de quando perguntava - O que está pensando?
Mania minha, que ao passar do tempo acabou por adquirir (inconsciente).
"MANIAS SERÃO VISTAS COMO DEFEITOS. DEPOIS, COMO TRAÇOS DE PERSONALIDADE, ATÉ QUE SEJAM TRANSFORMADAS EM VIRTUDES." Carpinejar
Ter se acostumado um com o outro, não significa que avançamos...



Pergunte-me hoje o que estou pensando e não terá resposta! Penso no quão sou feliz ao seu lado.

quinta-feira, 28 de julho de 2011

etc e tal

Desde agora sou feliz! Encontrei a criatura com quem sonhava, meu ideal em amor.
Aspirei sempre em ter um ideal de vida boêmia, como nos livros, entretanto... brrr

Durante alguns dias, passei a melancolia do coração ermo para os que me cercam, agora, em um delicioso acaso (inesperado, pois sempre não aparece de primeira), vi seu rosto que corou e me mostrou os dentes brancos!

quarta-feira, 27 de julho de 2011

Vênus

- Vênus, Vênus, divina Vênus!
Desapegando os olhos da parede, onde estava uma pequena cópia da Vênus de Milo, arremeteu contra o papel e arrancou dois versos que completaram a quadra começada às cinco da manhã.
A xícara de café, que trouxe cedo, estava ali, intacta e fria sobre a mesa; a cama, ainda desarrumada, era uma pequena cama de ferro, a mesa que escrevia era de pinho; a um canto um par de tênis.
Com os pés metidos em chinelas velhas, com a cabeça apoiada na mão esquerda, ia escrevendo... Quando acabou, releu e queimou.

terça-feira, 26 de julho de 2011

Estrumeira

Quero um noivo rico... Que não seja muito formoso! Formosa já sou eu. Quero um noivo de ouro. Adoro tudo que é de ouro: jóias, moedas, noivos...
Ama-se, geralmente, as montanhas por sua beleza verde, frondosa, que a reveste; eu amo a montanha, porque sinto lá dentro da crosta granítica, o espesso filão de ouro. Os imperadores romanos faziam esculpir em ouro as próprias figuras... Os raios de sol são de ouro.
Enfim, serei conquistada pelo ouro!
- Chama isso "vender-se".
- Eu "vendo-me"!
Fiquei horrorizado, como tais blasfêmias poderiam sair de tão belos lábios? Como era horrível a lagarta do ouro, a sair por entre as rosas daquela boca!
Alguns metros a frente, havia acumulado a um canto uma porção de estrume. Sobre o estrume, uma pomba, de lindos pés revolvia com as unhas o monte infecto, procurando comida...
Fez-me arrepiar o epigrama da casualidade.

"Escute o meu silêncio"

- O que exatamente o senhor quis dizer nessa parte aqui?
Olhou por cima, o trecho que lhe mostrara, com desdém.
- Você fuma?
- Sim!
- Ora, venha que eu explico...
Saiu, apressado, tateando o corpo a procura do maço de cigarros. Apanhei o meu e fui lhe fazer companhia.
Estava sentado em um daqueles bancos de madeira, sempre com nomes escritos com corretivo (errorex, branquinho, toque mágico... como preferir).
- Sente! Certifique-se de que não tem merda.
Ofereceu-me um cigarro, aceitei.
- Nem fumar podemos mais!
Concordei balançando a cabeça e fiz um sinal para que me emprestasse a brasa.
- Qual era mesmo sua pergunta?
- Nada não...

segunda-feira, 25 de julho de 2011

Sombras da memória

No átimo de tempo que transpassava a lucidez e a inconsciência apoiou-se sobre a mesa do jantar e leu algumas anotações feitas pela manhã. Enlaçando as pernas caminhou até a cama tentando rememorar as anotações. Foi inútil! Inúteis também eram as anotações, apenas uma maneira solitária de conviver com a própria... solidão.
Abriu a garrafa de Highland Park que guardara durante anos para alguma comemoração (que não aconteceria), com amigos (que não possuía).
Sozinho, bebeu. Na memória, avulsos recortes de seu passado pareciam tão frescos quanto o gosto de carvalho maduro do Highland Park. Sentia o hálito quente de sua irmã recitando Shakespeare e cobrando-lhe atenção para sua leitura eloquente, escutava a voz branda de seu pai contando o relato de sua fuga da Rússia para não servir o exército do Czar...
As pálpebras começaram a ficar pesadas, apagou a lâmpada de cabeceira e como se já soubesse o que aconteceria somente esperou.
Uma dor súbita queimou o peito, segurou firme a garrafa e tomou o último gole antes que uma de suas coronárias se obstruísse totalmente, impedindo a passagem de sangue para o coração.


domingo, 24 de julho de 2011

Uma dose a mais

Vontade de encontrar alguma coisa... Não sei onde... Para alimentar alguma coisa que não sei onde perdi.
Vontade de dizer alguma coisa... Não sei como... E que nunca vou saber dizer.
Pus-me a caminhar em silêncio ao lado dela (que não se apressou) olhando também para o chão nos segundos que antecedem a explosão de um olhar direcionado a mim.
Apenas um olhar bastava, para que devolvesse minha insônia, minhas bobagens... Não olhou.
E depois, a luz apagou. Não mereci uma dose a mais daquele olhar.